Quando terminei a faculdade de audiovisual, cheia de planos e certezas, pensei: Agora sou uma adulta de verdade. Formar-se parecia o primeiro marco oficial da ilustre vida adulta. Era como se eu estivesse entrando em um mundo promissor, onde entrevistas de emprego, networking e construir um nome fossem os próximos passos naturais.
Imagina o meu choque de realidade quando percebi que o mercado não era bem um tapete vermelho, mas sim uma máquina do tempo diretamente pro ensino médio. Panelinhas, hierarquias disfarçadas (de que?), matérias que você ama ou apenas suporta, e aquela eterna busca por descobrir onde você se encaixa. Só que, agora, as "aulas" são sets de publicidade, clipes musicais ou o caos criativo de um curta-metragem – uma nova sala de aula a cada semana, sem direito a férias fixas.
Independente de tudo, há algo curioso nesse caos: ele me faz querer mais (gananciosa? talvez um pouco rs). Quero aprender, colaborar e, quem sabe, sair dessa jornada com sonhos intactos, amigos de verdade e uma trilha sonora que faça sentido. Porque, se a vida adulta é realmente uma reprise do ensino médio, que pelo menos seja numa versão com mais liberdade artística.
Durante a faculdade, tive o famigerado estágio obrigatório. Diferente de muitos colegas que acabaram em produtoras burocráticas, eu tive a sorte de trabalhar em uma produção independente de curta-metragem. Cinema de guerrilha? Sim, mas ainda assim cinema. Ali, no calor das gravações e cercada por pessoas que eu acreditava serem os gigantes da área (ingenuidades de principiante), percebi que o cenário era uma grande... panelinha (essa expressão nunca morre...). Pessoas que estudaram juntas, se contratando em esquema de broderagem, mas agora com contratos e cachês no lugar de grupos de WhatsApp com nomes questionáveis.
Foi ali que entendi como o mercado funcionava e percebi que sobreviver numa nova escola seria um desafio. Afinal, era como entrar em uma nova sala de aula onde não conheço ninguém e precisar me enturmar rápido para passar de ano. Meu grande dilema? Se eu ainda não sabia exatamente o que queria fazer, como encontraria o "grupo perfeito"? Não parecia inteligente apostar minhas fichas na turma do teatro se eu não me garantia interpretando Julieta, nem me comprometer com as Olimpíadas de Ciências enquanto meu coração batia pelo jogo de basquete marcado para o mesmo horário. (Pegaram a referência?rs).
A solução era clara: eu precisava experimentar todas as panelinhas, aprender com cada uma, e, de quebra, ser chamada para todas as festas (ou no caso, produções). Foi assim que desenvolvi duas abordagens que me ajudaram a navegar nesse universo: a "generalista vs. especialista" e a estratégia do gente fina.
No primeiro conceito, percebi que, se eu me aprofundasse muito em uma única área, me tornaria indispensável para uma única função — e, consequentemente, para produções muito específicas. Por outro lado, se soubesse um pouco de tudo, poderia ser valiosa para todas. A escolha era difícil (mais ou menos), mas optei pelo segundo caminho. Claro, isso exigia que eu fosse boa o suficiente em cada área para ser escolhida em vez de outra pessoa com habilidades semelhantes, e foi aí que entrei na espiral de cursos, noites mal dormidas, burnouts, e assistências em projetos sem cachê — o preço de ser versátil.
Já o segundo ponto, o famoso gente fina, consistia em ser chamada para os jobs mesmo quando não era estritamente necessário que fosse eu. Não sendo a pessoa mais especialista em tudo, eu compensava (ou tentava) com energia boa no set, espírito colaborativo e aquela atitude de “estou aqui para somar”. A lógica era simples: quem não gosta de trabalhar com alguém que facilita a vida e ainda traz leveza ao ambiente? Essa abordagem foi a minha solução perfeita para encontrar um espaço sem me comprometer a longo prazo — pelo menos até precisar pagar as contas.
Navegar entre áreas tão distintas do audiovisual me ensinou que ser generalista é como carregar uma mochila cheia de ferramentas – útil em quase qualquer situação. Mas ser especialista é ter a chave certa para abrir portas específicas. A escolha entre os dois caminhos nunca foi fácil. Em um comercial, você precisa da eficiência de um especialista; no cinema, da flexibilidade de um generalista; e, na música, talvez de uma pitada de ambos. No fim, percebi que o segredo está em ser estrategicamente generalista: ter profundidade em algumas áreas-chave, mas saber o bastante de tudo para se manter relevante.
Minha primeira experiência em publicidade foi como assistente de produção em uma live pré gravada (sim, isso existe!). Era como entrar em uma sala de aula onde todos tinham suas funções muito bem definidas – quase como se estivessem sentados em ordem alfabética. Mas, por trás da fachada de organização, as "panelinhas" também estavam lá: a turma dos diretores criativos, o grupo dos produtores e os freelancers que pareciam os alunos transferidos. Destacar-se nesse cenário significava ser uma mistura de generalista e especialista. Eu precisava entender o ritmo rápido e a hierarquia firme, mas também saber improvisar – uma habilidade que aprendi tentando conseguir 64 marmitas em um sábado pós eleição, dirigindo (ou tentando) um carro manual depois de 3 anos da prova do detran.
No universo dos clipes musicais, as coisas eram diferentes – quase como aulas extracurriculares. É um ambiente experimental, onde criatividade tem prioridade, mas os desafios continuam. Trabalhei em um clipe que parecia tirado diretamente de um manual de "cinema de guerrilha 2.0": locações emprestadas, orçamento apertado e uma equipe que misturava especialistas com iniciantes. Aqui, ser generalista era crucial. Em um momento, eu montava o set; no outro, ajustava o áudio ou dava pitaco na direção de arte. Essa fluidez era recompensadora, mas também cansativa – afinal, o trabalho nunca parava, e o cronograma era tão apertado quanto o figurino da cantora .
No cinema, especialmente em produções independentes, existe um senso de "comunidade" mais evidente. Durante um curta-metragem de guerrilha, a produção é “por amor” - ninguém (lúcido pelo menos) trabalha 12 horas em pé em troca de uma carona e um copo de coca-cola no almoço. A colaboração é vital - a junção de profissionais da área, entusiastas e estagiários atrás de horas - todos com um propósito em mente: a criação de um projeto do qual eles acreditam valer a pena. Em um destes inúmeros projetos que fiz durante a faculdade pude ver de perto essa comunidade - mas não se engane, as panelinhas estavam lá, apenas disfarçadas de “equipe unida”. Eu era a recém-chegada, tentando achar meu espaço em meio a diretores de fotografia que só trabalhavam com seus amigos de anos e produtores que tinham uma lista fixa de assistentes. Era desafiador, mas foi ali que entendi o valor de ser "gente fina". Mesmo sem saber operar uma câmera RED perfeitamente, consegui ser lembrada para novos projetos porque era proativa, aprendia rápido e, honestamente, sabia onde ficava o chopp mais barato pro after.
Equilibrar a necessidade de adaptação com o desejo de manter a autenticidade é um dos maiores desafios no audiovisual – e, na vida. Desde o início, percebi que o mercado exige que você seja flexível: ajustar seu estilo de trabalho, aprender novas ferramentas, entender diferentes dinâmicas de equipe. Mas, em meio a tudo isso, surge a pergunta: o que me faz diferente de qualquer outro profissional adaptável?
Eu costumava acreditar que autenticidade era sobre defender uma ideia a qualquer custo, mas aprendi que é muito mais sobre entender quem você é no caos. Quando trabalhei em um projeto onde todas as decisões pareciam ser feitas em conjunto (mas, no fundo, só uma voz prevalecia), tive que encontrar meu espaço sem comprometer minha visão. Descobri que ser adaptável não significa abrir mão da sua essência; significa encontrar maneiras criativas de comunicar suas ideias, mesmo em ambientes desafiadores.
Uma lição que mudou minha perspectiva foi perceber que o trabalho é uma dança entre ser firme e ser fluido. Adaptar-se é o movimento, mas a autenticidade é o ritmo que mantém a dança interessante. Uma vez participei de um set onde as expectativas eram altíssimas, uma coreografia a ser seguida, em que a equipe havia ensaiado cada passo estabelecido. Em vez de tentar me encaixar completamente, eu trouxe o que sabia fazer bem e, ao mesmo tempo, mostrei disposição para aprender com eles. Tentei encaixar minha própria batida, um solo em meio a apresentação deles. Isso abriu portas – não porque eu era perfeita, mas porque era genuína.
Ao longo desse processo, entendi que o verdadeiro crescimento vem de como você lida com as dúvidas e imperfeições Hoje, vejo adaptação e autenticidade como forças complementares: a primeira me ajuda a navegar pelo presente, enquanto a segunda me mantém ancorada no que quero construir no futuro(eita que já podem tatuar essa frase hehe).
Então sim, trabalhar no audiovisual é como voltar ao ensino médio, onde uma reunião de equipe pode se transformar naquele trabalho em grupo onde só você está fazendo algo. Ainda assim, eu aprendi a navegar por essas dinâmicas – às vezes me juntando a uma panelinha, às vezes explorando todas, sempre tentando encontrar meu espaço. Descobri que ser "gente fina" abre portas e que ser generalista pode ser uma superpotência, desde que equilibrada com um toque de especialização.
Hoje, trabalhando em uma produtora – algo que nunca imaginei – percebo o quanto tudo isso tem moldado quem sou. Cada projeto é uma nova aula, cheia de desafios que exigem adaptação (sim, essa palavra de novo) e criatividade. Mas, no fundo, minha maior lição foi que a autenticidade não é sobre nunca ceder; é sobre continuar fiel ao que me move, mesmo enquanto aprendo a jogar conforme as regras.
O caminho é tortuoso, cheio de armadilhas e encruzilhadas, mas também de oportunidades inesperadas. E se o audiovisual me ensinou algo, é que seguir sonhos nunca será simples, mas será sempre válido – especialmente quando você encontra sua própria forma de brilhar em cada cena, mesmo nos bastidores.(precisava de algo pra terminar upbeat néah rs).
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